Na dúvida, sem sombra de dúvidas, absolve-se
01/04/2025 às 17:07
por Sérgio Odilon Javorski Filho
A Justiça não existe para agradar. Sequer a instrução processual mais eficiente é capaz de acessar pormenores do fato criminal. Os recortes unilaterais midiáticos, não raras vezes, conduzem a população a julgamentos pessoais arbitrários, contrários à distribuição de uma verdadeira Justiça humana, racionalizada a partir de critérios de imparcialidade e equidistância.

O dialogo se complica ainda mais quando a discussão recai sobre delitos contra a dignidade sexual. O estupro é capaz de causar repugnância aos criminosos mais frios e imorais enjaulados no sistema carcerário. Aceita-se matar um inocente, roubar o dinheiro da poupança de um aposentado, subtrair o trabalhador que está com o salário contado para o leite da criança, enganar o sócio, comercializar drogas em escolas, desviar o dinheiro de hospitais, mas estuprar é proibido, perante a lei penal e a delinquencial. Se o sistema é por fora todo imoral, não haveria de ser diferente internamente. 

Tornaram-se comum as acusações de abusos sexuais em desfavor de jogadores. Robinho cumpre pena de 9 anos fechado por um estupro cometido na Itália. Neymar e Mbappé foram acusados e seus casos não passaram da delegacia de polícia. Daniel Alves foi preso na Espanha e virou notícia no mundo. Depois de apresentar 3 versões distintas a respeito da acusação foi processado e preso por mais de 1 ano preventivamente. Sobreveio condenação à pena de 4 anos e 6 meses em primeira instância. Recorreu em liberdade provisória mediante o pagamento de uma fiança de 1milhão de euros. O caso foi apreciado pelo Tribunal Superior da Catalunha, 3 Magistradas e 1 juiz, por unanimidade, reformaram a decisão, para absolver Alves, devido à insuficiência de provas acusatórias. 
Em delitos sexuais, cometidos na clandestinidade, a palavra da vítima tem especial relevância, afirmam os tribunais. Contudo, o caso de Alves não ocorreu integralmente às escondidas. Dentro da boate Sutton, em Barcelona, Daniel e uma jovem de 23 anos ingressaram juntos no banheiro feminino, e de lá só saíram 16 minutos depois. A suposta vítima o acusou de obrigá-la a realizar sexo forçado, uma vez que na hora h desistiu do intento a princípio acordado. A juíza considerou duvidosa a versão de Daniel, alterada por 3 vezes. A Corte, corretamente, analisou primeiramente a prova acusatória e detectou “lacunas, imprecisões, inconsistências e contradições”, tanto no fato quando na fundamentação da sentença condenatória, ao julgar não confiável a versão além de insustentável isoladamente, em confronto com outras evidências, exames periciais, imagens de câmeras da boate e provas biológicas. A acusação pode e deverá recorrer. Daniel permanece inocente, mesmo desde quando estava condenado.

Conclui-se, assim, fosse o povo apto a julgar a si próprio não haveria Justiça. Cabe ao juiz silenciar os gritos fervorosos sobressaltados da praça pública para, no reservado de seu gabinete só escutar o som do processo exalado do confronto probatório em cada uma de suas páginas examinadas, e jamais esquecer: Na dúvida, sem sombra de dúvidas, absolve-se. “É melhor correr o risco de salvar um homem culpado do que condenar um inocente” (Voltaire).
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