
O autor com o sheik Mohamad Fadlallah, lider espiritual do Hezbollah

Fruto de pesquisas de campo realizadas em povoados do sul do Líbano, em 2008, dois anos depois da guerra deflagrada por forças israelenses contra o Hezbollah, a Editora da Universidade Federal do Paraná apresenta o livro
Psicanálise, Catástrofe Social e o Trauma: Resistência e resiliência da comunidade xiita do Sul do Líbano aos bombardeios de Israel em 2006, do psicólogo e professor Jamil Zugueib Neto que, atualmente, coordena o eixo de pesquisa sobre Catástrofes, Contemporaneidade e Interculturalidade na Association Internationale pour la Recherche Interculturelle –ARIC, sediada na França. No Brasil participa da Rede Nacional de Prevenção em Desastres.
Para o lançamento do livro, o único publicado por um estudioso brasileiro a partir de fontes primárias, será realizado um encontro online entre o autor e os professores Natália Nahas Calfat, coordenadora do grupo de trabalho de pesquisa sobre Oriente Médio Mulçumano, na USP, e Renato Costa, da Unipampa- Universidade Federal do Pampa, especialista em relações internacionais e geopolítica do Oriente Médio.
Jamil Zugueib Neto lecionou na UFPR, atuou no campo da saúde mental e da psicanálise. Entre as instituições se destacam o Manicômio Judiciário e Instituto Médico Legal do Paraná, campo da psicopatologia forense. A partir de seu doutorado, estendeu seus interesses para a psicopatologia social, a violência étnica e os processos identitários no Oriente Médio, temas do livro
Identidades e crises sociais na contemporaneidade (Os drusos na guerra do Líbano), também lançado pela Editora da UFPR). Para o psicólogo”, o livro é uma contribuição original para a compreensão da vivência traumática de grupos etno-confessionais no Oriente Médio.
O atual trabalho, com trinta entrevistas realizadas em Khiam e B’nt J’beil, conta o autor, teve objetivo de “captar não só a experiência subjetiva dos bombardeios, mas também a vivência durante os vinte anos de domínio israelense em suas terras”.
Os entrevistados - jovens, os mais velhos, líderes religiosos, combatentes - são protagonistas de uma história contada a partir de 12 de julho de 2006, quando o Hezbollah ataca uma patrulha israelense na fronteira com o território palestino. Israel responde com 33 dias de bombardeio por terra, ar e mar no sul do Líbano e em Dahe, no subúrbio de Beirute, áreas de concentração da população muçulmana xiita, base e apoio do Hezbollah.
Contudo, os israelenses encontraram resistência acirrada dos guerrilheiros, distribuídos em túneis e cavernas, enquanto uma grande quantidade de foguetes era lançada todos os dias em direção a Israel, que ao fim, pela primeira vez na história, teve que recuar. Assim, o Hezbollah libanês obteve, segundo suas lideranças, a “vitória divina”. Entretanto, Jamil Zugueib Neto pondera: “É evidente que a vivência da guerra, do perigo de morte, da destruição de povoados, além da humilhação continuada provocada pelas invasões repetidas, marcam os indivíduos profundamente. A memória comunitária de perseguições em sua história se engatando ao presente desenha perfis identitários, os quais requerem análises multifatoriais para um conhecimento mais adequado das reações psíco-sociais dos sujeitos em questão”.
Ao analisar as respostas dos entrevistados, o psicólogo dividiu sua amostragem em três grupos. Os jovens não engajados ideologicamente: os mais afetados pela guerra. Os mais velhos alegando “nada é novo nesses bombardeios”: pragmáticos e resistentes pois sempre conviveram com os renovados conflitos. E os combatentes: apesar do sofrimento, orgulhosos em combater Israel.
E pôde constatar o que já é sabido na história: “O engajamento ideológico e a fé religiosa são fatores de resistência psíquica e multiplicadores da própria violência. Fatores de laço comunitário e sentimento de acolhimento para o sujeito”.
Em suas experiências que marcaram o início de sua vivência no Líbano, o autor recorda de pequenos tiroteios nas ruas, de jatos israelenses sobrevoando o país diariamente, parecendo bombardeios ao provocar estrondos quando quebravam a barreira de som, e da paisagem de casarios destruídos e estradas repletas de despojos de guerra. Um evento de perigo real foi quando precisou gritar em árabe que era brasileiro, diante de uma arma engatilhada por um miliciano que tomava conta de um posto de controle.
Ao fim, o professor resume que a desorganização subjetiva do trauma será provocada mais pela lembrança deste cenário insuportável do que de seu acontecimento real: “A comoção psíquica resultante será o fruto desta representação angustiante”.
Jamil Zugueib realizou essa incursão no Líbano movido, não só por seu interesse decorrente da sua formação na clínica psicológica, mas também sentimental: “O Líbano é o país de meu pai e avós. Já percorri todo seu território, a pé, de carro e de bicicleta incluindo a Síria e o deserto da Jordânia. Foi emocionante andar nas ruas que meu avô pisou e entrar na igreja que ele ajudou construir em Dohur Chueire”. Frequentar os institutos de pesquisas da França nesses três países e em Israel, foi outra experiência apaixonante.
Anote:
O encontro online pode ser acessado, gratuitamente, das 19h às 21h, no dia 21 de setembro, pela plataforma https://bbb.c3sl.ufpr.br/b/jam-iww-l8n-f4e
Em Curitiba, o livro estará disponível na Livraria da UFPR (Rua Gen. Carneiro, 460), no campus da Reitoria (entrada pela rua Dr. Faivre), telefones (41) 38887764 e (41) 988443273. Atende de segunda a sexta das 9h30 às 18h. E-mail:
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