Black Friday e as origens da efeméride do consumismo contemporâneo
26/11/2020 às 14:04
A origem da expressão Black Friday para designar o dia mais esperado pelos consumidores norte-americanos com sua avalanche de promoções irresistíveis, é bem menos poética como pode sugerir a data ansiosamente aguardada das grandes redes varejistas nos Estados Unidos, e que se tornou uma febre mundo afora.

Várias são as explicações sobre os primórdios esse fenômeno que arrasta multidões de pessoas às lojas no dia seguinte ao feriado religioso de Ação de Graças nos Estados Unidos, e que se tornou um convite mundial à indulgência consumista, evento imperdível para grande parte da população.

Hordas de pessoas comparáveis aos exércitos invasores de Gengis Khan acampam a partir da zero hora nas portas das lojas que anunciam as melhores promoções e descontos, no afã de conquistarem os primeiros lugares nessa maratona de compras.

Segundo o Jornal Huff Post, em 2018 apenas nos estados Unidos, na primeira madrugada do Black Friday, os norte-americanos que pacientemente aguardaram em filas dos caixas das lojas em todo o país, gastaram a estratosférica importância de 6,2 bilhões de dólares, sem considerar as vendas do comércio eletrônico.

Em 2020, com a nuvem negra da COVID-19 pairando sobre nossas cabeças, e todas as restrições impostas à locomoção e mobilidade, o cenário será um pouco diferente, já se prevendo um crescimento exponencial das vendas online em todo o mundo, impulsionado fortemente pelo chamado “consumo de indulgência, onde a compra de um item de “pequeno luxo” é uma forma de auto recompensa pelo alto nível de angústia e estresse que vimos enfrentando.

Mas, o pano de fundo para o surgimento do termo não é tão glamouroso.

A história mais conhecida é aquela segundo a qual, por volta dos anos setenta, na sexta-feira seguinte ao do feriado de Ação de Graças, data religiosa solene e muito tradicional nos Estados Unidos, as pessoas tinham por costume iniciar as compras de natal, e esse aumento significativo no consumo era suficiente para deixar os balanços dos varejistas “in the black”, o equivalente em português a (contas) “no azul”, pelo ano seguinte inteiro.

Então, a sexta-feira pós ação de graças passou a ser conhecida como “Black Friday” e se tornou a data oficial do início da temporada de compras de fim de ano.

Apesar de sua conotação atual estar relacionada ao prazer de consumir, essa não foi a primeira vez que se usou a expressão. Muitas décadas antes nos fins do século XIX, Black Friday era um termo associado a acontecimentos bem menos empolgantes.

Em 1896, devido à especulação no mercado de ouro levada a efeito por dois inescrupulosos financistas de Wall Street, Jay Gould e Jim Fisk, que manobraram para fazer o preço do ativo subir artificialmente, a fraude foi descoberta em uma sexta-feira, fazendo desabar a cotações do metal, levando à bancarrota empresários poderosos e grandes latifundiários.

Menções ao termo Black Friday foram também encontradas a partir dos anos cinquenta nos registros do departamento de polícia da Filadélfia, sempre temerosa da sexta-feira após o dia de Ação de Graças, por conta do aumento de ocorrências como furtos, acidentes de trânsito, engarrafamentos devido ao grande afluxo de pessoas ao centro da cidade que lotavam as lojas para o início do período de compras de Natal. (“This Friday was black with traffic”).

Em tempos digitais, além da Black Friday soma-se a Cyber Monday, porém, em períodos de pandemia, o cyber shopping provavelmente deverá começar na própria sexta-feira.

Muito embora seja uma data ovacionada pelo comércio, a Black Friday também simboliza o lado obscuro do consumo, com multidões avançando tresloucadamente sobre mercadorias tal qual estouros de boiadas. Comportamentos irracionais que nos levam a comprar coisas que não precisamos com o dinheiro que não temos.

Com a economia duramente atingida pela imposição do confinamento e medidas de distanciamento social, quem sabe o ano de 2020 sirva à reflexão sobre o esgotamento do modelo de sociedade que construímos nos últimos cinquenta anos e suas nefastas consequências.

Ana Fábia R. de O. F. Martins - Advogada, Especialista em Direito e Negócios Internacionais e Moda.
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